sexta-feira, 18 de maio de 2007

Fábulas


O Lobo e o Cordeiro
"Na água limpa de um regato, matava a sede um cordeiro, quando, saindo da floresta, surgiu um lobo, que trazia a barriga vazia, porque não comera o dia inteiro.
- Como ousas turvar a água que estou bebendo? - rosnou o Lobo a antegozar o almoço. - Fica sabendo que caro me vais pagar!
- Senhor - falou o Cordeiro - encareço a Vossa Alteza que não vos zangueis, mas acho que vos enganais: bebendo quase vinte passos abaixo de vós, não posso turvar-vos a água.
- Turvas, turvas! - replicou a besta cruel.
- E também sei que, no ano passado, disseste mal de mim.
- Mas como, se nem tinha nascido? Ainda mamo na minha mãe.
- Se não foste tu, então foi o teu irmão.
- Não tenho nenhum.
- Foi algum dos teus. Chega de argumentação. Estou a perder a paciência!
- Disseram-mo. É necessário que me vingue.
Lá mais abaixo, no interior da floresta, o Lobo devorou o Cordeiro, mesmo sem processo e sem trânsito em julgado."
Jean de La Fontaine, Fables, I, 10

Argumentar tem muito que se lhe diga! Vale a pena analisar, a partir desta fábula de conteúdo profundo como todas as de La Fontaine, o tipo de argumentação aqui desenvolvida:
. Argumentação da má-fé
. A decisão antecede a deliberação: argumentar é justificar
. Procura forçada de argumentos
. Refúgio em falsos testemunhos (também sei; disseram-me)
. Argumentos forjados (se não foste tu, então...)
. Fuga para diante, perante a falta de argumentos
Conclusão: existem muitas formas de argumentar e há sempre a possibilidade de escolher uma em detrimento de outras. Mas, sobretudo, parece ser muito importante reconhecê-las...

(imagem recolhida aqui )